Luiz Sanches
Vitor,
56 anos, casado, três filhos, moreno, sem camisa, catador de papel,
sofredor e feliz.
Jocivaldo,
não importa o que ele é ou faz; é somente o coadjuvante.
Tem
também a polícia, mas eles só aparecem depois.
A
Claudete vinha pela esquina ruma a sua casa. O Vitor vinha do rumo da
casa da Claudete para a esquina. O Jocivaldo não importa aonde
estava, ele é somente o coadjuvante, eu já disse! A policia? Já
vou contar!
Pois
então. A Claudete avistou o Vitor de longe catando os seus papeis e
logo ela se apavorou, pois o Vitor poderia assalta-la, pensava
Claudete. Chiquerérrima como anda, estava com colar, brincos e
pulseiras de ouro. Não há outro caminho, tinha que passar pelo
Vitor, na rua escura, sem ninguém, para chegar em casa. Outro
poderia disser: “então porque não volta ou esconde o ouro”.
Não! Eu estou contando a história e ela tem que passar pelo vitor!
Que coisa!
Então,
voltando: não que o Vitor se tratasse de qualquer ameaça eminente,
mas os preconceitos da Claudete a ameaçavam ferozmente. Logo o
coração, segurado pela garganta, contorcionava-se a cada passo ao
encontro do Vitor, que nem estava dando bola para a Claudete. Paços
apertados, Claudete no momento do encontro passa raspando pelo Vitor,
quase gritando de medo, enquanto juntava as presas algumas pulseiras
e as guardava no bolso.
-Dona!
Oh Dona! Dona!!! –repetia Vitor para a Claudete, que apavorada
fingia que não era com ela e apertava mais o paço. Tinha medo de
parar e ser assaltada, mas o catador de papel logo chegou ao seu lado
com uma das pulseiras da Claudete na mão. Como tinha conseguido
rouba-la tão rápido? Claudete não esperou ser violentada e foi
logo dizendo com as pernas bambas: “toma moço, pode levar, não
precisa fazer nada comigo!”. E a policia nessa hora? E o Jocivaldo?
O Jocivaldo não importa, mas a policia dobrava a esquina neste
instante.
-O
senhor aí! Oh vagabundo! Mãos para cima!
Vitor,
sem obedecer, questiona:
-Não
moço! Eu “to” é devolvendo para ela. Não sou ladrão não! Sou
trabalhador, tenho três filhos e...
E
repentinamente toma um tapa do policial, o catador sem camisa, que
logo ouviu o ouvido tinintar um “zum zum zum”. “Você está
achando que eu sou trouxa é?” –responde logo o policial. E o
Jocilvaldo? Já disse que não importa! Deixa eu continuar a
história...
-Ai
que bom que o senhor apareceu. Ai... que bom... –Dizia Claudete,
bamba, quase urinando nas próprias causas.
-Eu
não fiz nada! Nunca na minha vida eu roubei! Nunca! Eu vi que ela
deixar cair o bracelete e fui devolver. Sou honesto! –Vitor se
defendia e agora o amedrontado era ele.
-Olha
policial, eu vi tudo, este senhor (o Vitor) não roubou, a mulher ai
deixou cair a peça. –dizia do nada um jovem que veio do outro lado
da rua correndo: é Jocivaldo, vinte e três anos, solteiro, “boa
pinta”, está estudando para passar no vestibular, caçula da
família e adora jogar xadrez. É o salvador do injustiçado Vitor e
deixou de ser o coadjuvante desta história... ufa, finalmente né?
-É
verdade senhora? Pergunta intrigado o policial.
Claudete
toma fôlego: “nossa, não sei”. Jocivaldo defende mais ao Vitor:
“ele anunciou assalto? A senhora é que ficou com medo à toa!”
-Ai...
é verdade! Ai moço (Vitor), desculpa, nossa, que vergonha.
Agora
vem a parte interessante da história, continue lendo, não saia daí:
O
policial solta o catador honesto. Faz as suas recomendações de que
tome cuidado e vai embora. O tapa que Vitor levou ficou por isso
mesmo. Vitor, humilhado, se vira para a Claudete:
-Eu
nunca roubei na minha vida! Sou pobre, nasci pobre e vou morrer
pobre. Não sei ler nem escrever, mas uma coisa que aprendi é seguir
o que os meus pais me ensinaram: a ser homem! É o que eu ensino aos
meus três filhos. Nunca roubem, podem passar fome, mas não precisam
disso. Eu as vezes não tenho o de comer, mas também não tenho
muito o que me preocupar. Os ricos tem tudo e se preocupam com tudo,
pois podem lhes roubar as únicas coisas que possuem. Eu vivo bem e
tranquilo, sem preocupações com o amanhã. Nós somos pobres, mas
descobrimos a felicidade nas pequenas coisas. Sou feliz com a minha
esposa e filhos e não preciso de muito para viver. Os ricos precisam
acrescentar mais coisas dos shoppings para preencher o que lhes
faltam e nunca estão satisfeitos, porque felicidade não se compra.
As pessoas perdem muito tempo da vida se importando com o material e
morrem sem se tornar felizes no simples, e não conseguem cumprir com
o objetivo principal da vida, que é ser feliz.
Claudete,
amargurada, em casa, um tempo depois deste ocorrido, pensa nas
palavras de Vitor. Questiona se ele realmente é feliz. Talvez esteja
neste momento, sem muito o que comer, mas rindo com os filhos, e ela,
sem um amigo sequer.
Assim
termina essa história rápida. Ah! Já ia me esquecendo: o
Jocilvaldo passou no vestibular e virou o orgulho da família!