terça-feira, 5 de junho de 2012

Dou-lhe uma oportunidade




Luiz Sanches

Augusto é um homem de negócios. Batalhou como cão em sua juventude e agora desfruta de um emprego fixo, rentável e promissor como gerente de uma grande indústria têxtil. Conheceu boa parte do Brasil durante viagens de negócios e numa destas viagens foi apresentado a Isabel, com quem se casou e tem um casal de filhos. Os filhos estudaram em boa escola e logo aprenderam de negócios. O mais velho, fez administração e com vinte anos de idade já exercia a profissão em uma pequena empresa, mas de renome. Como na família de Augusto a grande maioria teve que se contentar com subempregos, Augusto e seus filhos são vistos por estes como orgulhosos, sortudos e seu filho, como protegido do papai, que lhe deu um emprego de "mão beijada", o que não é verdade, já que seu filho adquiriu o emprego por conta própria.
Augusto sabendo da dificuldade financeira do seu irmão César aproveita outra viagem de negócios para visitá-lo e oferecer emprego aos seus filhos. Ao chegar a sua casa, como sempre, César reclama da vida difícil e pede um dinheirinho emprestado, algo como uns dois mil reais. E como sempre também, Augusto nunca empresta, mas oferece uma oportunidade de estudo a César e seus dois filhos. César reclama de já estar velho demais e não ter paciência para estudar e que seus filhos não precisam de estudo, precisam sim é de um bom emprego e que remunere bem. Augusto, já aguardando esta resposta, chama os rapazes, de vinte e um e dezoitos anos e lhes oferece primeiramente estudo. Os rapazes só querem saber de computador e baladas. Augusto oferece emprego, mas nem sequer se preocupam em dar prosseguimento à conversa. César reprime os rapazes que apelam dizendo ao pai que este deve prover o sustento da família e não eles. Augusto, sem sucesso, resolve passear algumas vezes na cidade com os rapazes e aos poucos tenta os convencer do emprego ou do estudo, mas relutam e aceitam somente que o tio lhes pague a cerveja.
Numa das saídas à cidade, porém desta vez sozinho, Augusto vai a uma pizzaria ao ar livre e repentinamente vem ao seu encontro uma moça vendendo flor, bonita, maltrapilha e esfomeada. Claro que Augusto não tinha a quem oferecer a flor e logo descartou a compra, mas a moça perguntou: "o senhor vai comer o resto da pizza? É que estou com fome!". Sem entender ao certo o que comandou a Augusto, este diz à moça que pode se assentar e comer. Sem vergonha para pedir, mas em excesso para se assentar, a moça come em pé e sabe-se lá porque, permanece comendo ali. Logo sai, profundamente agradecida e apresada para vender um mínimo de flores nesta noite. Augusto observa e reflete no que é a vida. Como pode a vida amargurar a quem deseja lutar e abastar a quem pouco se importa. Reflete no que ele pode oferecer a alguém desconhecido. Porque insistir em ajudar a quem não quer? Porque é parente e mesmo não tendo retorno financeiro, terá prestígio e admiração? Sentir-se-á antes os seus como o provedor? Vale a pena? Alcançará estes objetivos inúteis? Augusto se levanta rumo à moça e lhe pergunta se quer emprego. O que ele não esperava era dele ser surpreendido. A moça é uma repórter disfarçada fazendo uma matéria sobre moradores de rua. Augusto apareceu na televisão. A família toda o viu como um bem feitor.
Seus sobrinhos, por outro lado, ficaram chateados de não serem convidados para aparecerem neste dia. Augusto volta para São Paulo como o tio que se esqueceu dos sobrinhos e seu irmão não lhe dirigiu mais a palavra, que o considerou como orgulhoso por querer aparecer sozinho na televisão: "porque não chamou meus filhos neste dia, seria tão bom para eles"... reclamou sempre deste este dia em diante César, pelas costas de Augusto.

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