terça-feira, 26 de março de 2013

Poemas, versos e citações 2



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A inspiração
Ah como eu queria que o mundo sentisse isso que transborda dentro de mim. Ah como eu queria saber dizer onde está o caminho da inspiração. Ahhh, como eu queria saber compartilhar... te encher de prazeres improdutíveis por outro meio senão o teu interno! Como eu queria calar a boca do enfurecido com o silêncio da sabedoria. Como eu queria abrir os corações de pedra cansados de sofrer utilizando novos esplendores. Como eu queria derrubar o stress do mundo pela música que toca a alma. Talvez não possa, mas se te toquei, já basta!
Luiz Sanches


As janelas da minha casa
Abri a janela de manhã. Estava escuro e chovia
Eu não senti o perfume das rosas
Sei que os perfumes das rosas justificam-se pelo adubo.
Mas se não der raiz, pelo menos foi plantada
Não é porque ao tentar se colher a flor, e sem querer se quebrar o galho,
que ela não irá exalará mais o seu perfume.
Talvez ela possa ser replantada e gere frutos.

Mas ouvi a musica tocar e olhei para o outro lado
Não era a janela aberta, mas um longo percurso
Eu vi os meus paços. Faziam uma curva
A chuva ficou mansa e senti a água fresca
Acho que preciso respirar o ar puro, crescer, refletir e lutar

Repentinamente me senti com ânsias
Percebi que os pássaros a muito cantavam e eu não escutava
O sol acorda todas as manhãs
Mas só ilumina quem o aceita
Percebi que a voz dá base ao grito
Que as pernas já andavam sozinhas quase correndo
Aí o novo e a maturidade vieram me visitar
Ah como é bom ser feliz por si só e ter o que doar
Luiz Sanches


A chama que corrompe
Oh forte chama que rouba o momento e afervora sem razão. Sou do ar e trago combustível a flama que tudo incinera tal brasa ardente a minha vida.
Abraço o futuro que me corrompe por não estar aqui.  Afugento o agora com gás inflamado que excita meus quereres ardentes de ti. Como refrear o fogo que tudo consome sem me deixar saborear? Como saber que hora é a hora e que hora esfriar?
Luiz Sanches

Eu sei
             Eu sei que você tem muito a oferecer! Eu sei que você se guarda! Eu sei que você se acha menos do que é, só esperando alguém para te elevar e te convencer que você é muito mais! Eu sei que você não confia, mas o que mais quer é confiar! Eu sei que tem hora que você quer, quase se joga, mas volta atrás! Eu sei que não é tão simples! Eu sei que a vida te deu rasteiras, mas em quem não deu? Eu sei que você tem tanta coisa para falar e acha que ninguém quer escutar. Você quer sair, rir, se divertir, mas não! Eu sei e você sabe também: você é especial! O que você tem para mostrar cabe em um caminhão! Todo mundo sabe e você sabe que não esconde.
            E acima de tudo, eu sei que você sabe que eu sei! E sabe de uma coisa? Porque você não se permite? Porque luta? Você é tão humano quanto eu! Você tem tantas vontades quanto qualquer um! Tem gente que se apaga. E você? Eu sei!
Luiz Sanches


Conto um encanto
 De pronto, o pranto prostrou-se em seu canto, dando luz ao encanto dos sentidos.
Entretanto, somente peço que produza tal encanto de contato constante e colado, assim agarradinho feito fonte de contento que apronte ao meu lado.



Luiz Sanches


quinta-feira, 21 de março de 2013

A falta que um amigo faz




Luiz Sanches

Jogado as traças, fedendo pela falta urgente de um banho, fato ignorado pela enfermeira que trocava o turno e negligenciou para poder jogar paciência no computador. São três da manhã, sem carros demonstrando que ali existe uma rua, sem visitas... Ah! Estas nem de dia! Clemente despertou de um sono gostoso para a vida real. Ele está num hospital da mais alta classe. Seu coração não entra no passo a décadas e agora suporta o corpo com esforços exorbitantes. A esposa não demonstrou a esperada luta ao seu lado. O filho, na obrigação urgente em doar sangue ao decadente pai, descobre, aos 29 anos, não ser filho legítimo deste, no momento da doação, pela incompatibilidade sanguínea. A gastadora esposa de clemente o traíra a anos e só agora ele tem conhecimento do fato, para piorar o já sofrido órgão. Clemente não tem parentes ou amigos que se possam chamar de próximos. Ele é um astro da música popular. Admirado, invejado, motivado, contrariado e outros “ados” fizeram de sua carreira um sucesso esplendido, sustentado por pilares fortes como palitos de picolé.  A enorme massa de fãs se silencia à noite frente ao prédio, que por ser um hospital, por motivos óbvios, precisa de silêncio. Se este não fosse, a massa gritaria noite adentro o nome de Clemente Pedra, com poucos conhecendo seu nome de batismo que nada lembra seu nome artístico.

Clemente só no quarto escuro, com aquela queimação na garganta, com aquele vazio interno, mas o peito apertado, com sabe-se lá a espera de quê, com um... Como explicar?!?... Chora o aparente fim do ciclo de vida. Talvez não passe dessa. A falta que alguém próximo lhe faz. Alguém que não precise ser famoso. Alguém só pra falar de bobagens. Só pra ali estar, qualquer hora que precisasse. Alguém que sinta prazer na sua presença e que transforme qualquer ambiente ranzinza em recinto das risadas. Alguém que compreenda aquilo que não se diz e sinta a falha na fala quando se declara “eu estou bem!”.  Alguém para fazer presença até calado. Alguém para se importar. Para contar os casos antigos como se acontecesse no instante que o locutor relata o fato com aquele contento que liga a todos numa mesa de festas ou numa rua qualquer. Este alguém não há! Talvez seja um pouco tarde para perceber quanta falta isso fez em sua vida, mascada pelos microfones afoitos a uma entrevista da sua gloriosa carreira.

Semanas após a entrada no hospital, os parentes de Clemente se reuniram em lágrimas no hospital, para preparar os papeis necessários para a partilha de bens, devido ao falecimento do astro da música popular. O que os tomou de surpresa é que desconheciam com exatidão a real situação de Clemente (não acompanharam sua cruel estadia no hospital), e foram enganados pela impressa sensacionalista: Clemente Pedra vivia e bem! Mesmo desenganado pelos médicos. Sua melhora foi espantosa e quase milagrosa. Ele descobriu na calada da noite aquela pessoa que sempre lhe fez falta nos dias e noites de solidão que lhe acompanhavam após os shows, ou em casa. Não descobriu um novo amor por uma enfermeira. Não foi uma fã ou um fã que se aproximou e falou exatamente aquilo que Clemente sempre precisou ouvir. Não foi o médico que soube exatamente o que existe no mais profundo dele. Foi Clemente que se descobriu a si mesmo! Viveu a vida para dar alegria aos outros pela sua música, mas se esqueceu de contentar a si mesmo. Não tinha tempo em meio à multidão para ouvir a melodia de seu próprio coração. Só falava aos entrevistadores o que ocorria externamente e nunca ouviu seu interior. Não aceitou seu nariz e se submeteu a cirurgia, porém agora nota que este era igual ao da sua mãe. Não se permitiu encantar pelo silêncio sozinho e rir consigo mesmo. Não se questionou de seus próprios conceitos infundados. Jamais se divertiu sozinho em meio às montanhas. Não se lembra de realizar projetos novos e desafiadores, que só permitem conquistas individuais. Não procurou o que mais gosta de fazer. Não cozinhou nem aprendeu. Não se debruçou ante as pernas numa encosta para vislumbrar o pôr do sol. Não saboreou o que para ele era importante e aos outros pouco importa. Só atendeu aos pedidos alheios e negligenciou os próprios.

Clemente achou uma companhia que estará sempre contigo, na felicidade ou infelicidade. A doença foi o alicerce para parar e refletir sobre si mesmo. Se alguém se ama, não há quem possa derramar ódio para lhe derrubar, já que alguém só se deixa sentir odiado se no seu interior não exista quem tome partido e demonstre que é na verdade, um ser amado! Por fim, Clemente se recuperou, porque a cura se faz por dentro e não só pelos medicamentos. Ele ainda cantou muitos anos após, salvo por uma amizade de ouro que poucos infelizmente conhecem.

quinta-feira, 7 de março de 2013

Erivaldo é um homem de costumes



Luiz Sanches

Erivaldo é um homem de costumes, prefere o que é consagradamente certeiro: "time que está ganhando não se mexe"; esta é uma de suas habituais frases. Não que seja um homem nervoso, mas por vezes perde a cabeça. Dizem que por isso ficou calvo. Erivaldo não é um homem de se preocupar com as aparências e possui uma barriguinha protuberante. Com o avanço da idade, já que possui uns cinquenta anos, o bigode ganhou uma característica marcante em relação aos outros homens: o lado direito está com os fios todos brancos e o esquerdo esbranquiçando aos poucos, ao natural da idade. Parece até que pintou só um dos lados. No novo emprego, conheceu a Neuza, que é uma mulher que jamais se deixa ser vista sem maquiagem. Possui como arma batons de cores que nem o arco-íris conhece, sempre engatilhados para modificar a cor e brilho dos seus lábios carnudos, glitter para realçar, brincos sortidos e grandes, pó para o rosto, pincéis e mil outros apetrechos absolutamente desconhecidos pelo mundo masculino. Numa destas conversas com Erivaldo que tenta se enturmar no novo emprego, a Neuza, muito franca e até indelicada, vai soltando aos poucos o seu descontentamento quanto à aparência dele. A Neuza não perde a oportunidade de apontar algo que julga errado nas pessoas e com o novato Erivaldo não seria diferente; é o seu modo de se mostrar conhecedora da moda chique e de dar a sua contribuição para que todos fiquem no "ponto". Numa destas conversas atravessadas e intrometidas da Neuza, Erivaldo revela:
-Minha mulher adora a barba, quando nos conhecemos já tinha barba.
-Adora nada... - Dizia a Neuza - Mulher nenhuma gosta. Olha, ela não fala pra não te deixar sem graça. Vai por mim, conheço!
Com tanto falar a Neuza e suas colegas, Erivaldo aos poucos foi cedendo e se sentindo mal com a sua aparência. Começou a se observar no espelho. Necessitava entregar um novo homem a sua esposa.
Quando Erivaldo já estava no emprego a um mês, Luciana, sua esposa, deveria ficar uma semana em um congresso em outra cidade. Era o momento do ataque da Neuza: -"Erivaldo, aproveita e mude-se todo para quando ela chegar encontrar um novo homem!". O levou a um cabeleireiro, cortou a barba, o fez insistentemente comprar uma peruca, camisa nova estampada, trocar o óculos (o antigo não estava na moda), comprar uma cinta para segurar a barriga, perfume do tipo que nunca usou, trocou os sapatos novos porque a cor não estava agradável, até a sobrancelha estava diferente e os pêlos do corpo depilados e... Erivaldo sem perceber já tinha gasto todo o primeiro salário. Mas era outro homem. "Pronto!"- dizia a Neuza com um belo sorriso -"ela vai amar! Agora só falta você fazer um tratamento para essas estrias, inclusive, a sua mulher também, tem também que tirar uma papada aqui e diminuir o nariz..." - lá ia soltando os defeitos da mulher com todas as letras na frente dos vendedores da loja, quando fora interrompida pelo Erivaldo, que já se cansara de tanta mudança: -"ta bom, ta bom, preocupa não... preocupa não".
No dia da volta da mulher, Erivaldo a avisara que teria uma grande surpresa. Preparou o jantar e os filhos o ajudava, segurando o riso ou espanto, para não constranger ao pai. Quando ele ouviu a chave na porta dos fundos, correu para abraçá-la e ao vê-lo, Luciana espalha andares acima do prédio um enorme grito de susto, crendo se tratar o marido de um ladrão: nunca o vira sem barba e já se acostumou com a sua careca. Não se sabia quem se assustou mais: ela, o marido "disfarçado" ou a mulher do terceiro andar com o amante na cama. Luciana demorou a aceitar a nova "cara metade". Faltava nos beijos a barba encostando ao seu rosto e a careca charmosa. Gostou da camisa nova, mas do marido... Como dizer a verdade? Como não magoar o homem que se modificou tanto para agradá-la infrutivelmente... O conheceu já sem alguns fios na cabeça e tornou-se mais charmoso a cada fio a menos. Quanto a barba, o admirou de início por esta. Ter uma barba meio branca não o tornava um palhaço, mas o "seu" homem em meio à multidão, único, diferente... ele! Sem saber como elogiar, sentia-se ao lado de um outro qualquer que invadira sua casa e só pensava: "onde está o meu marido?". Luciana ama ao Erivaldo na sua forma física como ele é. Nunca sentiu vergonha pela barriga saliente ou a barba desfigurada. Em meio ao jantar, teve uma ideia, o puxou para cama e apagou todas as luzes, agradeceu pelo que fez por ela e o abraçou fortemente. "Ah..." -pensou -"agora sim, esse é o marido que eu amo!". Sem jamais lhe contar que estava desapontada com as mudanças, tratou de tentar se acostumar à nova aparência, porque o que importa para ela é o que os olhos não vêem.